Sobre o livro “A idade dos milagres”
A Editora Paralela é um novo selo da Companhia das Letras. Achei um tanto heterogêneo seu catálogo, mesmo ainda com poucos títulos. Só comprei A idade dos milagres — título fraco e, aliás, inadequado — porque sua proposta me pareceu instigante e, de fato, dá vontade de ler rapidamente até o fim.
Romance de estreia de Karen Thompson Walker, logo na primeira página nos revela a situação: os cientistas descobriram que a rotação da Terra começou a desacelerar. Isso significa que, aos poucos, os dias começarão a durar cada vez mais. Não se sabe aonde isso vai chegar. Imagine a hipótese de um dia de 60 horas: 30 com sol, 30 na escuridão da noite...
Nesse sentido, é uma história que intriga a imaginação — como ocorre com os "filmes-desastre". Curiosamente, recordei-me da sensação de quando, lá pelos 12 anos de idade, li o livro A chave do tamanho, de Monteiro Lobato, em que Emília e todas as pessoas se veem diminuídas a poucos centímetros de altura.
Para fazer render um romance, a autora cria a história de uma menina, quase adolescente, que é a narradora em primeira pessoa. De certo modo, a trajetória pessoal dessa protagonista poderia ter sido construída em um romance que não tivesse esse pano de fundo tão especial. Um autor que pretendesse valorizar o fenômeno natural que é o pressuposto da história acabaria por focá-lo num cientista, por exemplo. A abordagem se deslocaria, num "espectro de gêneros", para o campo da ficção científica.
Embora essa seja uma consideração hipotética — afinal, o romance já está escrito —, não dá para negar que as partes mais interessantes sejam as que falam das consequências políticas e sociais mais amplas do fenômeno. Por exemplo, o conflito entre as pessoas que defendem o uso do "Horário do relógio", que se torna oficial, e o "Horário natural", que é dos rebeldes. Essa tensão geraria um delicioso debate, mas somos obrigados a ver a questão de uma longa distância.
Em minha leitura, portanto, há um descompasso entre a história e o contexto. Temos, no final, um romance somente agradável e interessante, que eu indico para quase qualquer tipo de leitor que esteja buscando um título curioso e relativamente curto. Um livro seguro para dar de presente a alguém.
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