quarta-feira, 31 de março de 2010

Quero meu celular bloqueado

Alguém me explique, por favor, por que a Anatel saiu com essa de desbloqueio obrigatório do celular e por que as pessoas estão comemorando.

Semana passada comprei meu novo celular, da Claro, bloqueado. Paguei 200 reais a menos do que pagaria pelo desbloqueado se o comprasse no Submarino, nas Americanas, etc. E olha que meu plano é pré-pago! Clientes do pós-pago podem conseguir descontos muito maiores no aparelho bloqueado da operadora.

Vá à página da Claro e veja a quantidade de aparelhos à venda, aí veja os descontos que você obtém ao comprá-los lá. Agora entre na página da Oi, essa “paladina” do desbloqueio, e veja se eles têm celulares à venda. Não têm.

Se a decisão da Anatel de fato vingar, em breve estaremos todos pagando o preço cheio dos aparelhos, sem descontos.

E não adianta tentarmos encontrar socorro nas tarifas das operadoras, todas têm promoções e acabam tendo custos equivalentes, e também seria necessário analisar a qualidade das ligações e do sinal.

Pra mim, aquela brincadeirinha da Oi é pura verdade: “quem ama bloqueia!”…

sexta-feira, 19 de março de 2010

O realce

O perigo começava. O pai estava no fundo da casa, talvez pitando cachimbo ou ainda com sono leve, e os malucos entravam pela frente, para trazer alegria aos irmãos. O novo ardia de expectativa, o mais velho coordenava a chegada das drogas com confiança e se sentindo muito preparado para o prazer.

Cada visitante tirou do bolso uma pedra brilhante, moderadamente quadrada, e a rolavam entre os dedos mostrando a beleza dos farelos que iam se descascando. O menino pensava se aquilo era de comer, de cheirar, de injetar, mas seu irmão tomou uma pedra nas mãos e começou a antegozar a alegria pelo tato.

Em instantes os irmãos já choravam, a vida terrível iria embora, a felicidade invadiria seus poros em farelos cheios de luz.

Os malucos partiram nas motocicletas, o garoto trancou o portão e voltou para a sala — a cabeça agora menos encantada. Tirou da mão do irmão a pedra que ele namorava na poltrona, e o pai apareceu, distraído.

Para choque de seu irmão, o menino ofereceu a pedra ao pai, dizendo “Coma”. O pai mordeu a paçoca e mastigou metade. Era bom, era doce, e o pai aprovou, querendo que comprassem mais desses.

sábado, 6 de março de 2010

Argumentos contra a mesada

Não tenho filhos ainda.

Quando criança, não recebia mesada – mas nunca passei nenhuma necessidade.

Meu primeiro argumento contra a mesada é que ela pode dissociar a criança do padrão de vida da família. O que aconteceria se os pais entrassem num aperto inesperado e tivessem que cortar a mesada do filho, total ou parcialmente? Isso pareceria “injusto” ao pirralho.

Além disso, permite o raciocínio: se uma mesada pode ser cortada, ela não é essencial.

Por outro lado, se os pais fizerem um esforço para manter a mesada durante o mau período, passarão uma mensagem ainda pior, confirmando na cabeça do menino a impressão de que tudo gira em torno dele e que ele está “blindado” contras as intempéries.

Acho duvidoso o argumento de que mesada “ensina independência” à criança. Isso será verdade somente se os pais, em seguida, cobrarem pela comida que ele come, pela roupa que ele veste, pela escola, pelo material escolar, pela gasolina do carro que o leva pra lá e pra cá, pela própria moradia e tudo o mais. Sem isso, a mesada é apenas uma carta branca para o supérfluo.

Sinto que não receber mesada em criança me ensinou coisas mais interessantes. Eu não tinha autonomia para comprar o que quisesse enquanto meus pais se esfalfavam sem tempo e sem condições para realizar algumas de suas próprias vontades. Os meus desejos estavam submetidos ao padrão geral da família.

Se eu queria figurinhas – o ícone do supérfluo entre as crianças –, iria consegui-las sempre que as vacas estivessem mais cheinhas, e ouviria um não diante das vacas esbeltas.

Isso transmite uma noção mais clara do que é dispensável, e afasta a criança da sedução das compras.

Outra consequência disso é ter aprendido a refletir melhor sobre o que comprar e quando: era necessário convencer meus pais de que o que eu queria era de fato algo que me “acrescentasse” de algum modo.

Embora eu possa ter uma índole natural nessa direção, acredito que tal experiência acabou por me tornar mais tolerante quanto a certas condições financeiras. Já guardei durante anos alguns desejos, sem que isso nem de perto tornasse minha vida mais “infeliz”. Uma proeza num mundo consumista e apelativo.