sábado, 6 de março de 2010

Argumentos contra a mesada

Não tenho filhos ainda.

Quando criança, não recebia mesada – mas nunca passei nenhuma necessidade.

Meu primeiro argumento contra a mesada é que ela pode dissociar a criança do padrão de vida da família. O que aconteceria se os pais entrassem num aperto inesperado e tivessem que cortar a mesada do filho, total ou parcialmente? Isso pareceria “injusto” ao pirralho.

Além disso, permite o raciocínio: se uma mesada pode ser cortada, ela não é essencial.

Por outro lado, se os pais fizerem um esforço para manter a mesada durante o mau período, passarão uma mensagem ainda pior, confirmando na cabeça do menino a impressão de que tudo gira em torno dele e que ele está “blindado” contras as intempéries.

Acho duvidoso o argumento de que mesada “ensina independência” à criança. Isso será verdade somente se os pais, em seguida, cobrarem pela comida que ele come, pela roupa que ele veste, pela escola, pelo material escolar, pela gasolina do carro que o leva pra lá e pra cá, pela própria moradia e tudo o mais. Sem isso, a mesada é apenas uma carta branca para o supérfluo.

Sinto que não receber mesada em criança me ensinou coisas mais interessantes. Eu não tinha autonomia para comprar o que quisesse enquanto meus pais se esfalfavam sem tempo e sem condições para realizar algumas de suas próprias vontades. Os meus desejos estavam submetidos ao padrão geral da família.

Se eu queria figurinhas – o ícone do supérfluo entre as crianças –, iria consegui-las sempre que as vacas estivessem mais cheinhas, e ouviria um não diante das vacas esbeltas.

Isso transmite uma noção mais clara do que é dispensável, e afasta a criança da sedução das compras.

Outra consequência disso é ter aprendido a refletir melhor sobre o que comprar e quando: era necessário convencer meus pais de que o que eu queria era de fato algo que me “acrescentasse” de algum modo.

Embora eu possa ter uma índole natural nessa direção, acredito que tal experiência acabou por me tornar mais tolerante quanto a certas condições financeiras. Já guardei durante anos alguns desejos, sem que isso nem de perto tornasse minha vida mais “infeliz”. Uma proeza num mundo consumista e apelativo.

2 comentários :

  1. Michelle Ferreira disse...

    Adorava mesada em doce de leite e chupchup

  2. Paulo Santoro disse...

    Michelle sempre sexualizando o debate... :-p