segunda-feira, 25 de março de 2013

O lobo, uma resenha.

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Num mundo de cada vez maior complexidade, torna-se mais encantadora a presença deste novo romance nas vitrines: o mais que simples título O lobo, de um autor com o nome mais que comum Joseph Smith — como se fosse um José da Silva em nosso país.

A Editora Objetiva, por meio de seu selo Alfaguara, está de parabéns por todo o trabalho de produção deste volume. A tradução de Adalgisa Campos da Silva é excelente. A edição arrisca inserindo figuras em um título adulto, mas é muito bem-sucedida com suas ilustrações sóbrias e pertinentes.

Encontrei este livro no meu passeio pela Bienal do Livro de São Paulo, em agosto do ano passado.  Devo ter compulsado dezenas de livros de ficção e este foi o único que comprei. É difícil achar aquilo que foge do ramerrão ou das invenções inócuas. Mas O lobo atrai pelo primeiro parágrafo:

Lá de dentro da floresta, à minha frente, eu posso ouvir um rangido de patas na neve. Tudo mais está quieto. Estou em pé, com a cabeça envolta na nuvem formada pelo meu bafo no ar frio, imóvel, só escutando, sem enxergar nada a não ser o chão branco e os troncos escuros e pontiagudos das árvores. Farejo a fera. Seu cheiro, marcante e intenso, sobe dos odores mais leves do mato e me seduz, me atrai até ela. A fera não pode estar longe, mas as árvores aqui crescem em tanta densidade que não consigo vê-la, e então avanço pisando de leve por entre as árvores, pulando por cima de galhos caídos, tão de mansinho que só um camundongo dormindo na toca embaixo de onde minhas patas encostam poderia abrir um olho para logo fechá-lo enquanto passo.

Sem nenhuma apresentação, somos lançados direto à ação, e vamos aos poucos deduzindo quem é esse narrador, onde ele está, quais os seus problemas. O ritmo das frases é fascinante, e conduz a uma leitura intensa e imaginativa, na qual cada palavra é útil para nos revelar uma pista do seu universo.

Uma grande conquista desse romance é a forma como o autor resolveu o problema de expressar as relações e as comunicações entre os animais. Com sua escritura de grande precisão e técnica, elaborou de forma convincente o canal do olhar: pelo olhar os personagens revelam — ou tentam ocultar — suas intenções, seus medos, seus desejos. Com esse artifício, a história sai do plano do mero relato e chega a um patamar carregado de dramaticidade.

Sou o lobo, o ceifador de vidas: o predador. Ataco de olhos abertos e vejo a morte luminosa e feroz pular no olhar da minha presa. Sou o lobo, a sombra que traz a luz da morte, a vida que concede a liberdade aos rebanhos temerosos e lutadores e que põe fim ao sofrimento dos fracos.

Como é de se esperar, vemos na vida e nas peripécias do lobo e dos personagens à sua volta  muitas das situações que envolvem nossas próprias vidas. Com isso, temos uma leitura ao mesmo tempo emocionante e valiosa para o crescimento pessoal.

Prefiro me refrear nos comentários para não fazer revelações que podem estragar o prazer de quem for ler. Recomendo o livro a todos os que gostam de boa literatura.

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